Despertar ideal

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Luís Alencar | Fortaleza CE
Acordem-me nos hospitais
anônimos sem faces
somente quando não mais
existir vida

e deixem o corpo oco
sem vozes
partir para seu maior propósito
e para a verdadeira jornada
em busca da redenção

e deixem-me quieto
com a ressaca de todos os vinhos
e cervejas
e álcoois
e tragédias
e deixem-me suportar tudo
sem algum medicamento
que não seja o tempo.

Estive farto por anos
do fingimento
e da misericórdia de todos
por esse ser enclausurado
na treva de suas próprias memórias

desistindo decididamente
de se tornar algo aconchegante
acolhedor
e notoriamente visível.

Afogo-me nos algodões das camas
e diante de um espetáculo de sem teto
vejo o desgaste da terra
e a queda dos céus ao meu redor

e sobrevivo porque peço
porque aquela não era a época do fim
ainda não

mas deixem-me seguir à minha maneira
evitando tudo que tenha de ser
superado
ainda provando o orvalho
de uma vida curta
e hostil
destrutiva para todos que me acompanham.

Sofre como se errasse com os deuses
como se houvesse uma única bala
confrontando uma execução coletiva.

Atiro em quem?
em mim mesmo?
não
sou louco a tal ponto
de atirar a bala às nuvens
e esperar furar duas ou três

e que chova em todos
que chova.

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